segunda-feira, maio 23, 2005

Portugal 5 - 0 Civilização

No rescaldo de mais uma época futeboleira, algumas notas:

1) Este campeonato foi uma merda. Nenhum dos grandes jogou o suficiente para poder ser considerado um incontestado vencedor. A haver um justo vencedor esse seria o Braga que, não fazendo uma época melhor que a anterior, sempre foi uma equipa mais equilibrada. Não, não foi o Braga que fez uma boa época; os grandes é que fizeram uma época miserável.

2) A Avenida dos Aliados não é terreno dos adeptos do FCP. Os adeptos benfiquistas moradores na cidade do Porto têm todo o direito a festejar na artéria principal da sua cidade o triunfo da sua equipa. Tal como o FCP teria todo o direito a desfilar em autocarro aberto pelas ruas de Lisboa caso se sagrasse campeão nessa cidade. Ou acham que os portistas de Lisboa não têm direito a festejar com os seus jogadores, porque vivem noutra cidade? Pretenderiam as criaturas nojentas que compõem esse bando criminoso chamado Super Dragões que todos os benfiquistas fossem expulsos da cidade do Porto, impedidos de aí viverem? Ou consideram os portistas que vivem em Lisboa como portistas de segunda?

3) O ambiente incendiário que se vive em Portugal sempre que o assunto é futebol mete-me nojo. Manifestações como as de ontem à noite, com cachecóis do Benfica a serem queimados em praça pública, cachecóis do FCP em que se lia "Filhos da puta" em vez de uma qualquer saudação à sua própria equipa e um tom intimidatório que durou toda a semana caso a comitiva benfiquista ousasse passear pela cidade do Porto demonstra que vivemos, de facto, num sistema de caudilhos, sem a mínima noção do respeito pela diferença, sem a menor ideia do que quer dizer democracia.

4) Já há alguns dias me tinha chamado a atenção que, 2 minutos após o apuramento do Sporting para a final da Taça UEFA, a única coisa que o bando de adeptos que emolduravam a reportagem da TVI conseguisse gritar fosse "Benfica é merda!" (também gostei muito do adepto sportinguista que, alegremente, fazia a saudação nazi para a câmara). Depois de na última semana ter ouvido da boca de vários sportinguistas que apoiavam o Boavista e que adoravam que o Benfica perdesse o campeonato na última jornada* (conheço até quem prometesse pôr um poster do Martelinho no quarto, caso tal acontecesse), percebo que, mais que um gosto pelos clubes, se desenvolveu em Portugal um sentimento "anti-qualquer-coisa". Sinceramente, já há algum tempo que defendo o fim do futebol profissional. Este é apenas mais um dos motivos. Este "espectáculo desportivo" tornou-se no lamaçal corrupto mais nojento de que há memória. E só não vê quem não quer. Quem ainda anda demasiado iludido com a ideia de que "o sistema prejudica sempre os mesmos" e de que "vocês sabem do que é que eu estou a falar" é que ainda não percebeu que a corrupção no futebol se joga em todos os sentidos. Todos. Sem excepção.

5) Há muito tempo que estou farto de Portugal. Depois da noite passada, após a euforia inicial (e que se manterá, no plano meramente desportivo, por mais algum tempo), ainda menos motivos tenho para gostar deste país medíocre, onde a lei da bala parece prevalecer cada vez mais. Estou farto, sim, muito farto deste esterco a que convencionamos chamar Portugal. O país em que os telejornais abrem com 20 minutos de festa benfiquista nas ruas, para logo de seguida ser apresentada a notícia de que o défice nas contas públicas corresponde a 6,83%, sem que, seguramente, grande parte dos portugueses se importe com isso. Uns por estarem ainda inebriados pela vitória recente. Outros por estarem demasiado embrenhados em congeminações, frustrações e demonstrações de raiva anti-desportiva. Alguém por aí me arranja um bilhete só de ida para o século XXI?

* Acham que, a partir do momento em que o Benfica deixe de poder ganhar uma qualquer competição, me interessa qual é a equipa que a vence? Ganhem juízo!