quarta-feira, junho 23, 2004

Canigou

Durante três meses, o Canigou foi o meu boletim meteorológico. "Da varanda da gruta, se vires o pico do Canigou, vai fazer bom tempo. Senão, vem aí chuva!"
E quando vinha, vinha mesmo! Até em pleno Agosto, as tempestades eram enormes, acompanhadas normalmente de trovoadas que se abatiam, invariavelmente, sobre o parque de campismo. Eu já nem acordava. Aquele vale fechado era perfeito para as trovoadas.

O Canigou entrou, portanto, na minha vida. Foi, durante aquele tempo, limite máximo a Sul. Dizia-me eu, então, uma pessoa "do Sul". Mas o meu "Sul" era muito para lá do Canigou. Afinal, o meu Sul tinha passado a ser bem mais próximo que aquilo a que estava habituado. Ao longo desse tempo, percebi que, aquilo que pensava ser um fenómeno da Catalunha espanhola, era comum à Catalunha francesa. "Avant d'être français, je suis Catalan!", como me dizia Nico, o dono do Café de la Place, capitão da equipa de rugby.

E explicavam-me muitas histórias em torno do Canigou. Fui-me apercebendo que o Canigou era, de facto, a montanha sagrada dos catalães. que, apesar de não ser tão elevado quanto os montes dos Pirenéus Centrais, contrastava tão fortemente com as terras baixas que o rodeiam, que se destaca, verdadeiramente, na paisagem. A cerca de 100 km, eu distinguia perfeitamente o pico coberto de neve, em Julho. E sabia que ali estava a barreira que me separava da Península.

Mas foi assim que me fui sentindo mais próximo do Canigou. Todos os dias olhava para ele, no intervalo do trabalho na gruta. E a cada dia me apercebia mais do seu estatuto dominante e modelador da paisagem que me rodeava. Hoje em dia, continuo a fazê-lo.

Quando lá voltei, de fugida, há um ano, compreendi, finalmente, que o Canigou era das coisas de que tinha mais saudades.