quinta-feira, maio 05, 2005

À espera da próxima

Ainda com um caso mal resolvido na consciência mediática portuguesa e já novo caso nos tenta roubar as atenções. Infelizmente para os meios de comunicação social, o assassínio da Vanessa tem contornos bem menos rocambolescos que o da Joana. Não temos direito a todo aquele aparato, as buscas, o regresso à casa, o ambiente CSI bem emoldurado pelos populares que, propositadamente, se deslocaram ao Algarve para verem o local do crime, para poderem dizer aos amigos, mais tarde "eu estive lá e os gajos não percebiam nada daquilo! cá p'ra mim, a miúda foi atirada a animais para ser comida!". Felizmente, desta vez parece que vamos ser poupados a esse triste espectáculo.

Quem não foi poupada foi a Vanessa, alegadamente assassinada pela avó e pelo pai (designações que têm de começar a ser repensadas numa sociedade onde se começa a tornar comum pais, mães, avós maltratarem e assassinarem com requintes de brutalidade filhos/netos de tenra idade)! Mas aquilo que mais choca nestas histórias nem é a morte ou as circunstâncias da mesma. Aquilo que mais choca é o autismo das instituições que supostamente deveriam estar encarregues da protecção de crianças! Senão, vejamos o caso da Vanessa:

Vanessa foi criada com a madrinha, Maria Rosa, que a queria tanto como a uma filha. Mas a menina, o ano passado, foi-lhe retirada pela avó, Lola.

No dia 1 de Dezembro de 2004, a Vanessa foi levada para o Bairro do Aleixo, sem que a madrinha e o marido o pudesem impedir, e contra a vontade da menina, que nunca conhecera outro lar. Segundo Maria Rosa, a pequena "chorou muito quando foi levada" em plena festa que tinha sido preparada para ela.

A avó, que só a ia ver uma vez por ano, exigiu ficar com a criança, alegando que era "uma decisão do tribunal". Segundo o CM apurou, o Tribunal de Matosinhos terá dado a custódia à avó em 2002. Mas só no final do ano passado e sob risco de perder o abono por não ter a criança a seu cargo é que a foi buscar.

Maria Rosa explicou ainda que a insistência da família em retirar a menina dos seus cuidados surgiu depois de a ter inscrito na pré-primária da Lomba, em Guifões. “Ela veio aqui dizer que eu não tinha direito de inscrever a menina sem a sua autorização, mas só estava preocupada com o dinheiro. Eu nunca quis dinheiro algum”, explicou.

Antes de retirada da família que a acolheu – de que fazem parte as duas filhas e um filho de Maria Rosa, elas de 22 e 24 e ele de 16 anos – Vanessa passou dois fins-de-semana no Bairro do Aleixo, mas “ia sempre contrariada”. “Cada vez que vinha de lá regressava faminta e suja, mas sem marcas de maus tratos", recorda a madrinha, Maria Rosa. “O fatinho que vestia quando foi encontrada morta fui eu que o comprei.”


Perante isto, pergunto-me, não porque é que o tribunal deu a guarda da criança à avó mas sim como é que, tendo esta sido dada em 2002, não foi verificado a posteriori o cumprimento ou não dessa indicação. Ou seja, como é que alguém "luta" em tribunal para obter a guarda de uma neta em 2002, não se preocupa em ir buscá-la para junto de si até 2004 e não há uma fiscalização, ninguém estranha esta situação?! Bom, para isso também parece haver resposta:

o presidente do Centro Distrital de Segurança Social, Rui Pedroto, nota que os técnicos não sabiam sequer da existência de Vanessa. É verdade que a avó da criança é titular do Rendimento Social de Inserção desde 1998 – chamava-se Rendimento Mínimo Garantido –, mas este foi atribuído em função de um agregado composto por três filhos solteiros, dois dos quais menores.

E quanto à entidade responsável, a Comissão de Protecção a Crianças e Jovens? Aquilo que ficamos a saber da boca da presidente da Comissão Nacional é que Saber que uma criança é vítima de maus tratos ou negligência e calar-se é “inadmissível” e que Dulce Rocha apela à comunidade para que mantenha os olhos abertos aos sinais de sofrimento das crianças e não hesite em denunciá-los às autoridades.

Ou seja, aquilo que nos está a ser dito é "façam o nosso trabalho, porque nós somos um bando de incompetentes, a ver se conseguimos evitar uma próxima situação deste género"!