Mesmo grátis! Mas mesmo, mesmo!
À mesa do restaurante de raízes já vetustas e tradicionalmente conotado com uma categoria de preços que já não corresponde bem à verdade, o peixe-espada grelhado não é suficientemente insinuante para me distrair do alegre momento em família que se desenrola na mesa do lado.
Progenitor classe média com ar de gostar de aeromodelismo ou coisa que o valha - Então, sempre vais comer carne?
Ditadorzeco irritante - Não queroooooo!
Progenitor acossado - Então vai ser o peixe?
Ditadorzeco irritante "mesmo a pedi-las" - Não gostoooooo!
Progenitor acossado - Então queres o quê?
Ditodorzeco irritante "que já estavas com uma lambada nas fuças, caraças" - Como da carne da mamã!
Progenitor acossado - Tá bem. Come lá a sopa.
Ditadorzeco - Não prestaaaaaa!
[Pronto. Se calhar eram duas, as lambadas.]
Progenitor - Senta-te como deve ser.
Ditadorzeco merdoso "que já tinhas era enfardado a sopa toda de uma só vez, meu rançoso" - A mesa aleija-me, não consigo pôr a perna como deve ser!
[cai o guardanapo do petiz, que finge esticar-se para o apanhar mas, ainda antes de se dobrar, já vai dizendo "Não chegoooooo"]
Progenitor - Deixa, filho, o papá vai lá.
[levanta-se, apanha o guardanapo, ajeita-o ao lado do Saddam loiro de óculos fundo-de-garrafa e pelo caminho ajeita-lhe a perna, não vá o menino magoar-se, malvada da mesa!]
Progenitor - Deixa o teu irmão em paz (...) que ele gosta de ti. E eu também.
Ditadorzeco cara-de-cu à paisana - Mas eu não gosto de tiiiiii!
Progenitor - Deixa lá. Já estou habituado.
Ora vejamos. Nesta altura já o peixe-espada está meio-engolido, a açorda (a)provada e o papá querido com laivos de jovem enfermeira nipónica submissa aos impronunciáveis desejos sórdidos sado-masoquistas de um qualquer senhor de negócios baboso (e seboso) já recorre ao oldest trick in the book: vencê-lo por uma falsa indiferença, tentando envergonhá-lo "Continua, que as pessoas da mesa ao lado não têm nada com que se entreter, tens tu de dar espectáculo".
Erro. Erro crasso. Meu caro, isso funcionaria consigo, que ainda via o Vasco Granja com as suas assertivas dentuças a falar de simpáticas animações checoslovacas. Funcionaria até comigo, que ainda tenho idade para ter levado com as clássicas ameaças veladas envolvendo um velho ou um cigano de saco, sempre pronto a tratar das quezílias domésticas. Mas, lamento informá-lo, não funciona com o seu filho de 5 ou 6 anos, que já viu a impunidade com que se pode atacar um país soberano "porque eles são os maus", ou a facilidade com que se manipula o papá e a mamã, ele que é um mero sub-produto de segunda geração das teorias pedagógicas que associam indissociavelmente os castigos a traumas irreparáveis.
É ele, aquele ditadorzeco da treta quem manda ali. É ele quem decide onde vai toda a família e, em última análise, quando se vão embora. É ele quem vos manipula a todos. Vá por mim, hoje é um jantar em família estragado, amanhã é uma exigência de compra de um carro "senão...".
Não há jantares grátis. Como aquele pai de família virá a perceber no futuro e como percebi eu quando me apresentaram a factura.
Progenitor classe média com ar de gostar de aeromodelismo ou coisa que o valha - Então, sempre vais comer carne?
Ditadorzeco irritante - Não queroooooo!
Progenitor acossado - Então vai ser o peixe?
Ditadorzeco irritante "mesmo a pedi-las" - Não gostoooooo!
Progenitor acossado - Então queres o quê?
Ditodorzeco irritante "que já estavas com uma lambada nas fuças, caraças" - Como da carne da mamã!
Progenitor acossado - Tá bem. Come lá a sopa.
Ditadorzeco - Não prestaaaaaa!
[Pronto. Se calhar eram duas, as lambadas.]
Progenitor - Senta-te como deve ser.
Ditadorzeco merdoso "que já tinhas era enfardado a sopa toda de uma só vez, meu rançoso" - A mesa aleija-me, não consigo pôr a perna como deve ser!
[cai o guardanapo do petiz, que finge esticar-se para o apanhar mas, ainda antes de se dobrar, já vai dizendo "Não chegoooooo"]
Progenitor - Deixa, filho, o papá vai lá.
[levanta-se, apanha o guardanapo, ajeita-o ao lado do Saddam loiro de óculos fundo-de-garrafa e pelo caminho ajeita-lhe a perna, não vá o menino magoar-se, malvada da mesa!]
Progenitor - Deixa o teu irmão em paz (...) que ele gosta de ti. E eu também.
Ditadorzeco cara-de-cu à paisana - Mas eu não gosto de tiiiiii!
Progenitor - Deixa lá. Já estou habituado.
Ora vejamos. Nesta altura já o peixe-espada está meio-engolido, a açorda (a)provada e o papá querido com laivos de jovem enfermeira nipónica submissa aos impronunciáveis desejos sórdidos sado-masoquistas de um qualquer senhor de negócios baboso (e seboso) já recorre ao oldest trick in the book: vencê-lo por uma falsa indiferença, tentando envergonhá-lo "Continua, que as pessoas da mesa ao lado não têm nada com que se entreter, tens tu de dar espectáculo".
Erro. Erro crasso. Meu caro, isso funcionaria consigo, que ainda via o Vasco Granja com as suas assertivas dentuças a falar de simpáticas animações checoslovacas. Funcionaria até comigo, que ainda tenho idade para ter levado com as clássicas ameaças veladas envolvendo um velho ou um cigano de saco, sempre pronto a tratar das quezílias domésticas. Mas, lamento informá-lo, não funciona com o seu filho de 5 ou 6 anos, que já viu a impunidade com que se pode atacar um país soberano "porque eles são os maus", ou a facilidade com que se manipula o papá e a mamã, ele que é um mero sub-produto de segunda geração das teorias pedagógicas que associam indissociavelmente os castigos a traumas irreparáveis.
É ele, aquele ditadorzeco da treta quem manda ali. É ele quem decide onde vai toda a família e, em última análise, quando se vão embora. É ele quem vos manipula a todos. Vá por mim, hoje é um jantar em família estragado, amanhã é uma exigência de compra de um carro "senão...".
Não há jantares grátis. Como aquele pai de família virá a perceber no futuro e como percebi eu quando me apresentaram a factura.